Com profunda preocupação ponho-me a pensar (e questionar) se a lei é realmente para todos ou somente para alguns, não encontrando amparo nem mesmo nas motivações anti-petistas para a juridicidade do indeferimento do pedido do ex-presidente Lula para comparecer ao velório de Vavá, seu irmão, cujo direito é assegurado pelo artigo 120 da Lei de Execução Penal, que com letras claras prescreve que “os condenados que cumprem pena em regime fechado ou semi-aberto e os presos provisórios poderão obter permissão para sair do estabelecimento, mediante escolta, quando… do falecimento ou doença grave do cônjuge, companheira, ascendente, descendente ou irmão”.
Ora, não me lembro de negativa semelhante a qualquer outro preso nestes 25 anos de militância na advocacia, parecendo-me questionável os argumentos para a negativa do direito em debate, notadamente quanto ao comprometimento da ordem pública com protestos a favor ou contra o político, posto que admitindo-se estas hipóteses, risíveis se não fossem cruéis e desumanas, por consequência, haveria se entender que as polícias federal e militar de São Paulo não garantem segurança alguma à sociedade, eis que colocadas em dúvida em relação a uma única pessoa, ainda que famosa como Lula.
O direito de velar o irmão é assegurado por lei, é questão que não se discute quando o detento assim decide fazer e, vale dizer, que não se trata de um benefício ao preso, mas de respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana, mas, ainda que admitisse a negativa do pedido de Lula, obviamente que haveria a necessidade de melhor fundamentação, amparada em elementos concretos, jamais baseada na admissão do risco eventual pelo simples fato de tratar de um ex-presidente da República.
A preocupante exceção da Polícia Federal, Ministério Público Federal e Justiça Federal de primeira e segunda instâncias em negar o direito de velório a um custodiado revela que o Estado de Direito está sob risco, revela uma discricionariedade não permitida em qualquer democracia, revela a perigosa possibilidade de quebrar as regras por mera conveniência (política ou não), revela que a legalidade possa ser discutida e superada pela suposição de um simples risco eventual, sem qualquer fundamento plausível.
É hora de repensar o direito e, inclusive, os limites às autoridades responsáveis pelo Brasil, é hora de exigir o efetivo cumprimento das leis para todos, inobstante a figura política que represente, pois, admitindo-se quebrar a ordem legal o Estado de Direito fica pequeno, fraco, abrindo caminho para o Regime de Exceção.