Máscara, check. Medição de temperatura, check. Higienização de ambientes e mãos, check. Marcações de distanciamento, check. Fila virtual de atrações, check. A rotina dos parques de diversão pós-pandemia no Brasil e no exterior deve incluir diversas novas medidas. Alguns já reabriram, outros estão com tudo preparado para a reabertura. Ainda assim, será que é seguro?
Para Fernando Aith, professor titular do Departamento de Política, Gestão e Saúde da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP), o retorno dos parques aqui é “muito precipitado, assim como a volta do comércio”. “O Brasil não fez isolamento decente, mesmo nos municípios com regras rígidas. No lockdown, o isolamento chegava a 60%, seja por educação ou incapacidade econômica para a população ficar em casa”, diz.
“Nesse contexto, a abertura de parques no Brasil é mais uma gota no oceano. A gente não precisava dela, mas não é o maior problema. Só vem impulsionar ainda mais o movimento de colocar as pessoas na rua, sem observar o distanciamento social, em um momento em que continuamos, por dia, com mais de 1.000 mortes e 40 mil infectados.” De acordo com ele, o foco agora deve ser ter critérios e regras muito claras para garantir a segurança das pessoas e até o fechamento dos parques se for preciso retroceder “É uma estratégia de redução de danos.”
Vanessa Costa, presidente da Associação das Empresas de Parques de Diversões do Brasil (Adibra), diz que as medidas de prevenção são cuidadosas. “Fizemos um protocolo muito embasado, seguro. Os parques preenchem vários check-lists de segurança. O protocolo da covid-19 é só mais um. Nossos funcionários já têm essa cultura.”
De acordo com a associação, estão em funcionamento apenas parques na região Sul, especialmente os próximos a Balneário Camboriú, onde ficam o Beto Carrero World (na cidade de Penha) e o Unipraias, complexo natural com atrações, mirantes e bondinhos Em 2019, os cerca de 100 associados da Adibra, com aproximadamente 600 operações (parques e bufês infantis), receberam em média 55 milhões de visitantes. Só o Beto Carrero responde por 2 milhões anuais.
As diretrizes da Adibra para a retomada levam em conta as medidas definidas pela associação mundial do setor – The Global Association for the Attractions Industry (conhecida pela sigla Iaapa), com 6 mil empresas de cerca de 100 países.
“Os parques lá fora estão seguindo os mesmos protocolos que os nossos”, garante Vanessa. “Temos sim capacidade de trabalhar sob os mais rígidos protocolos.”
Mundo
Conforme a curva da covid-19 diminuiu, países foram reabrindo atrações. Segundo parque europeu mais visitado, o alemão Europa-Park funciona desde 29 de maio. Principal do continente, a Disneyland Paris volta em 15 de julho. Na Ásia, a dupla Tokyo Disneyland e Tokyo DisneySea volta em 1º de julho. O Shanghai Disneyland Park foi o primeiro do grupo a retomar suas atividades no mundo, em 11 de maio. Depois, veio o Hong Kong Disneyland Resort, em 18 de junho. No dia seguinte, começou a reabertura em fases do Universal Studios Japan, da empresa concorrente.
Nos Estados Unidos, a curva da covid-19 segue crescendo na Califórnia e a Flórida, onde estão os parques preferidos dos brasileiros, embora nossa entrada esteja proibida no país por Donald Trump. “A situação nos Estados Unidos, que estão junto com o Brasil no nível epidêmico, é muito diferente em termos de compliance. Ou seja, lá as regras são muito claras de como vai abrir, o que tem de fazer, quais são os critérios da manutenção das atividades e, inclusive, quando fechar novamente se o nível de infecção e letalidade subir”, afirma Aith, da USP.
O retorno dos quatro parques temáticos do Walt Disney World Resort, na Flórida, está marcado para começar em 11 de julho. Na Califórnia, os dois parques do grupo devem receber visitantes a partir de 17 de julho. Para incentivar o público a seguir as novas medidas, o grupo fez uma criativa campanha com os personagens de Os Incríveis.
Enquanto o californiano Universal Studios Hollywood permanece fechado, a empresa puxou a fila das reaberturas na Flórida. Em 5 de junho, o Universal Orlando Resort iniciou a retomada de seus três parques. “Estamos limitando a capacidade de ônibus e táxis aquáticos (de transporte até os parques) e aumentamos nossos já rígidos procedimentos de limpeza e desinfecção. Em todas as atrações, estamos escalonando o preenchimento de assentos e filas para criar distância entre os grupos”, explica Juliana Pisani, diretora de Marketing do grupo para a América Latina.
A SeaWorld Parks & Entertainment retornou às suas atividades em 11 de junho. A empresa passou a exigir reserva antecipada para entrada em todos os parques da Flórida.
Por aqui, o Beto Carrero informa que funciona com 30% do público total. Segundo o parque, praça de alimentação e restaurantes abriram com 50% da capacidade e os visitantes passam na chegada por um nebulizador de higienização com água ozonizada. Para evitar aglomeração, o parque seguiu uma tendência internacional: oferece um aplicativo de fila virtual para o agendamento de até três atrações.
Shows em ambientes fechados não voltaram, mas o público pode ver Hot Wheels Epic e Madagascar Circus, em área aberta. No fim de semana passado, a foto de uma arquibancada, aparentemente lotada, viralizou na internet. A assessoria de comunicação do parque diz que o ângulo induz ao erro.
“Profissionais de fotografia sabem bem que fotos em perspectivas diferentes podem ser interpretadas de forma equivocada”, informa “Além disso, o distanciamento está sendo respeitado entre as famílias.”
Nenhuma foto pode ser tomada como algo definitivo, de acordo com Lúcio José Botelho, professor associado e doutor em Epidemiologia do Departamento de Saúde Pública da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). “A fotografia é sempre um corte no tempo. Para saber de fato, a gente teria de ver um vídeo, mostrando como as pessoas entraram, como saíram”, explica “Mas não há como juntar tantas pessoas em um ambiente e dizer que é seguro. O processo sem dúvida gera risco.”
“A decisão (de reabrir) foi tomada com base em nossa essência. Afinal, se Beto Carrero tivesse desistido no primeiro obstáculo, hoje o maior parque temático da América Latina não existiria.” A declaração, tão ingênua quanto a pureza de uma criança, poderia de fato ter sido dita por Betinho Carrero para explicar a reabertura em meio à pandemia de coronavírus, conforme sugeriu a assessoria de comunicação do parque. Mas não seria justo creditar essa responsabilidade ao menino fã do fundador do parque catarinense. Deixemos, então, a garotada com o que lhe cabe, a diversão, enquanto os adultos cuidam de assuntos sérios.
Preparados, mas ainda fechados
Localizado no Ceará, um dos Estados mais atingidos
pela covid-19, o Beach Park não tem previsão de abertura. Em São Paulo, o Hopi
Hari já tinha adesivado atrações para a retomada em 4 de julho, porém mudou de
rota após o aumento de casos de coronavírus na região de Campinas, onde fica o
parque.
“Nosso objetivo é retomar a operação de
maneira segura, tranquila e com as melhores práticas executadas no mundo
pós-pandemia, respeitando todas as normas sanitárias que o momento pede”,
diz Murilo Pascoal, CEO do Beach Park, que recebe cerca de 1,5 milhão de
visitantes por ano. “Queremos garantir um ambiente de segurança para
clientes e colaboradores e, por isso, estamos indo além e implementando
protocolos avançados de biotecnologia.”
Havia 104.422 casos confirmados da doença em 26
de junho, segundo dados do governo do Estado. Em Aquiraz, onde fica o Beach
Park, tinha 632 registros na mesma data. O parque aquático está a menos de 35
quilômetros de Fortaleza, com 34.580 casos. “O Ceará já passou pelo pico e
Fortaleza, há algumas semanas, está com queda nos indicadores”, diz
Pascoal. “Quando o momento da reabertura chegar para nós, já será com a
situação controlada, além de baixo risco de repique. Só retomaremos com o aval
dos órgãos responsáveis. Não há pressa.”
São Paulo
O Hopi Hari também não marcou uma data para a
reabertura – Campinas tinha 1.627 casos da covid-19 em 29 de maio e saltou para
6.604 em 26 de junho. “Estamos em estreito contato com as autoridades sanitárias
para garantir o momento mais oportuno em termos de segurança”, afirma, por
e-mail, Alexandre Rodrigues, presidente do parque em Vinhedo, a cerca de 70
quilômetros de São Paulo. Em 2019, o Hopi Hari recebeu em torno de 700 mil
visitantes, sendo quase metade deles provenientes da região metropolitana da
capital.
Em São Roque, a cerca de 75 quilômetros da
capital paulista, o Ski Mountain Park retorna só em 2021. Em comunicado,
informou que “a decisão foi tomada a fim de evitar impactos econômicos e
adequar o parque a novas exigências e protocolos estabelecidos pela OMS
(Organização Mundial da Saúde)”.