Preparados e equipados para reabrirem nesta segunda-feira (06), os donos de restaurantes de Guarulhos foram surpreendidos com a decisão liminar do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que, a pedido do governo do Estado, obrigou o município a obedecer exatamente às medidas previstas no Plano SP para a fase laranja, na qual está enquadrado.
Em Guarulhos, mesmo mantido em fase anterior à da capital, a prefeitura ampliou algumas autorizações – como a salões de beleza – e aumentou o horário de permissão de funcionamento em comércios. Os restaurantes estavam autorizados a reabrir no dia 6.
Às vésperas da tão esperada recepção aos clientes, eles terão que aguardar um possível avanço da cidade para a fase amarela ou, então, uma reviravolta na Justiça, tendo em vista que o prefeito Guti afirmou, na última sexta-feira (03) – mesmo dia em que a Prefeitura foi notificada sobre a liminar – que vai recorrer da decisão.
“Financiamos a folha salarial, os impostos, fizemos empréstimos para pagar os produtos comprados, que já venceram e não foram utilizados. Na ânsia de reabrir, compramos tudo de novo. E agora recebemos essa notícia”, aponta Helson Shikasho, dono do restaurante Nutri Nipo, em Cumbica.
“Eu tinha três restaurantes antes da pandemia. Fechei dois: um com 15 anos de atividade, próximo à Base Aérea, e o outro que funcionava há oito na mesma região. Tínhamos 120 funcionários. Hoje, cerca de 35″, conta o empresário, que admite ter adotado todos os protocolos imaginando que a reabertura aconteceria nesta semana. “Nós fizemos a identificação de distanciamento e colocamos uma pessoa para medir temperatura. Aumentamos o número de lavatórios e implantamos a utilização de luva descartável para o manejo dos utensílios”, conclui o comerciante, que diz que as entregas no sistema delivery não representam um terço do que era vendido antes.
Cidade deixada de lado
“Pelo que acompanhei, a Capital está numa situação pior do que Guarulhos. Então, não justifica [a decisão do TJ]”, pondera Helson. De fato, conforme balanço divulgado na quinta-feira, 2, pelas própria Secretaria Estadual de Saúde, a Capital registra 1.125 casos para cada grupo de 100 mil moradores, enquanto Guarulhos contabiliza 554,7 (menos da metade). Já em número de óbitos, a taxa em São Paulo também é maior, sendo 61,4 contra 54,0 em Guarulhos.
A região do Alto Tietê, à qual a cidade pertence, também tem melhores índices do que a Capital na ocupação das UTIs: 58,3%, quase 10% abaixo da Capital. Apesar dos números, o governo estadual incluiu a Capital na fase amarela, menos restritiva, e manteve o Alto Tietê na fase laranja.
“Não demiti ninguém, mas não sei mais o que fazer”
Manuel Teixeira, de 72 anos, dedica 50 deles ao seu restaurante, o Cumbicenter. Ele diz que toda sua equipe se mobilizou para o retorno das atividades no dia 6. “Fizemos uma limpeza profissional, investimos em totens de álcool gel, uma lavadora nova, termômetro digital, luvas descartáveis. Estocamos carnes, peixes e outros ingredientes. Convocamos funcionários afastados e treinamos todo o pessoal para trabalhar dentro das normas de segurança”, relata.
“Desde o início da quarentena trabalhamos em sistema drive-thru, mas devido à característica do nosso restaurante, não fomos bem-sucedidos. Continuamos oferecendo refeições populares, mas que não pagam nem o básico de nosso custo fixo. Não demiti ninguém, mas não sei o que fazer de agora em diante. São 27 funcionários que dependem de nós. Estamos desesperados e pedindo socorro”, finaliza o empreendedor.
Para o presidente da Associação dos Empresários de Cumbica (ASEC), José Júnior Araújo, a concessão da liminar é uma irresponsabilidade diante dos meses em que os empresários tiveram queda considerável de receita e do investimento feito para a reabertura.
“Havia um decreto que fixava a reabertura de bares e restaurantes, dentro de padrões de higiene e prevenção, no dia 6. São Paulo tem proporcionalmente mais casos do que Guarulhos, e lá a reabertura foi mantida. Pedir a liminar na véspera de uma aguardada reabertura, com os comerciantes investindo o dinheiro que não têm, é uma irresponsabilidade”, reclama o dirigente.
Para ele, em um bairro predominantemente industrial, como Cumbica, a situação dos restaurantes é ainda mais grave. “Cumbica tem restaurantes frequentados basicamente por empresários e funcionários das empresas, abrindo só para o almoço e durante a semana. Não há tradição do delivery e a situação é muito difícil, com contas atrasadas e sérios riscos de não abrirem mais”, continua.
Araújo lamenta a incoerência dos critérios usados pelo Estado para tratar de algo tão importante aos municípios vizinhos da Capital. “Guarulhos não pode ser tratada dessa forma. As cidades são interligadas e o fluxo entre elas é enorme no dia a dia. Pessoas que moram em São Paulo vêm trabalhar em Guarulhos e vice-versa. Não faz sentido esse descaso com Guarulhos”, completa.