A pandemia colocou em risco a situação financeira de muitas empresas no Brasil, prejudicando também a relação entre elas e os consumidores. Tais efeitos vêm sendo percebidos pelo Ministério da Justiça, por meio da Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), que promoveu hoje (23) um seminário virtual para debater a criação do Conselho Nacional de Defesa do Consumidor e a harmonização das relações de consumo.
Representando o ministro da Justiça, André Mendonça, o chefe de gabinete da pasta, Rodrigo Hauer, disse que os direitos dos consumidores podem ficar comprometidos, caso as empresas não sejam preservadas durante a pandemia. Hauer defendeu a harmonização, não só do direito e da proteção do consumidor, mas da relação do consumidor com a regulação e com a economia.
Ele disse que o Ministério da Justiça tem recebido e discutido muitos de consumidores tentando fazer valer os seus direitos. “A gente sempre brinca que tem de ter a ponta contrária porque, se a empresa não existir, ou se quebrar na pandemia, não vai ter direito a ser protegido, porque simplesmente não se vai conseguir exercer esse direito”, afirmou Hauer ao abrir o seminário.
Nesse período especificamente, tem sido uma luta tentar encontrar equilíbrio para tentar preservar a empresa e para que o consumidor tenha seu direito garantido, complementou Hauer, ao relatar que o ministério tem mantido contato com agências e órgãos estaduais e federais, na busca de “harmonia e segurança na aplicação das regras”.
Falhas de mercado
Segundo o gerente de Políticas Públicas e Relações com a Mídia do Instituto Proteste, Henrique Lian, o Brasil trabalha com um conjunto limitado de ferramentas para lidar com as falhas de mercado. Ele citou especificamente a assimetria de informações entre agentes econômicos, falta de concorrência adequada, com mercados pouco competitivos, além de “externalidades negativas que transferem para a sociedade custos que deveriam ser internalizados pelos produtores e provedores de serviços”.
Lian acrescentou que há, no país, duas formas de enfrentamento dessas falhas de mercado: regulação e a judicialização. Para ele, ambas são, de alguma maneira, soluções tutelares. “A solução regulatória é obviamente muito importante e relevante, mas seu excesso de ênfase aqui no Brasil despreza igual chance de encontrarmos falhas de regulação e de governo. As falhas do governo são de regulação, de aplicação e de fiscalização da lei. Falhas estas que impõem um custo alto para a sociedade.”
O gerente do Proteste ressaltou que a solução jurisdicional, que deve ser o último recurso, tem sido banalizada como meio de pressão, se não de ameaça. “Estamos neste momento vendo setores inteiros ameaçados de desaparecer e, enquanto isso, organizações vociferam contra medidas protetivas que vão ao socorro desses setores, como se o interesse primeiro dos consumidores não fosse dispor de fornecedores competentes e financeiramente saudáveis para atender a suas necessidades e desejos.”
Defesa, concorrência e regulação
Diretora de Programa da Secretária-executiva do Ministério da Economia, Kélvia Frota disse que, para o bem dos consumidores, é muito importante a harmonização entre as políticas de defesa tanto da concorrência como do consumidor, e da política regulatória, uma vez que o excesso de judicialização tem custo muito alto.
“Nesse sentido, a ampliação do diálogo entre as instituições e a ampliação da transparência do debate é a estratégia vencedora”, afirmou.
Divisão de responsabilidades
A diretora de Política de Concorrência e Proteção ao Consumidor da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (Unctad), Teresa Moreira, apontou, como forma de assegurar a proximidade com os consumidores, a divisão de responsabilidades com os municípios. Segundo Teresa, foi essa a preocupação do governo português, na época em que ela foi diretora-geral de Proteção do Consumidor naquele país.
“Como consumidores que somos todos, sabemos que é fundamental uma relação de proximidade para informar, sensibilizar, educar e atender pedidos de informações e reclamações, para promover a resolução de conflitos de consumo”, completou a diretora da Unctad.