A pandemia mudou a cara do e-commerce brasileiro. A
transformação ocorreu não só por conta da aceleração nas vendas, mas também nos
tipos de produtos mais vendidos e até no jeito de operar, agora bem mais
descentralizado. Se em 2019 os eletroeletrônicos foram as vedetes de vendas,
com a pandemia os itens de supermercados ganharam a dianteira e viraram a
grande aposta dos gigantes do varejo online em 2020.
“Em 2019, o celular era o item mais vendido
no nosso site e, em 2020, os hortifruti ficaram entre os dez mais”, afirma
Raoni Lapagesse, diretor de Relações Institucionais da B2W. A varejista, uma
das maiores do e-commerce, faturou R$ 18,5 bilhões de janeiro a setembro entre
todos os produtos, próprios e de terceiros, com crescimento de 53% ante 2019. O
executivo conta que a categoria supermercado era muito pequena dentro da
companhia e, “da noite para o dia, tornou-se uma frente
importantíssima”.
Em janeiro de 2020, a B2W comprou o Supermercado
Now, uma empresa online do setor. Em abril, já na pandemia, lançou o Americanas
Mercado e fechou parcerias com as redes Carrefour e Big para ter cobertura
nacional nas vendas de alimentos. Com isso, a categoria supermercado foi o
grande destaque do terceiro trimestre nos resultados da empresa.
As vendas desse segmento cresceram nove vezes em
relação a igual período de 2019. Em número de itens, os produtos de
supermercados foram os mais comercializados nos últimos dois trimestres até
setembro.
Por conta desse desempenho, a companhia decidiu
apostar em bicicletas elétricas para conseguir entregar um volume maior de
compras de alimentos e bebidas, itens de consumo imediato, num prazo mais
curto, de até 3 horas.
O projeto começou com apenas 50 bicicletas
elétricas no Rio e São Paulo pela pequena oferta dessas bikes no mercado, diz
Lapagesse. Com capacidade de transportar 180 quilos, um volume muito maior do
que uma bike comum, a bicicleta elétrica cargueira se encaixa perfeitamente
nessa nova frente de negócios, além de ter uma pegada sustentável.
O Magazine Luiza, gigante do varejo que teve no
terceiro trimestre mais da metade do faturamento vindo do e-commerce, tinha
planos de entrar no segmento de supermercado, porém não em 2020, conta Bernardo
Leão, diretor de novos negócios. Com a pandemia, enxergou na venda desses itens
uma oportunidade e antecipou o projeto.
Em março, em menos de dez dias, a varejista
ingressou no segmento de supermercados. “Hoje é a categoria número um em
itens vendidos. No terceiro trimestre foram mais de 5 milhões de pedidos”,
conta Leão.
O Magalu opera nessa categoria com estoque de
terceiros e também próprio, comprando diretamente da Unilever, P&G,
Coca-Cola e Ambev, por exemplo. “Mais que dobramos o número de marcas em
relação aos três primeiros meses do ano.”
Custos
Não foi por acaso que grandes empresas do varejo
online decidiram investir no segmento de supermercados. Ele representa ainda
cerca de 1% do total das vendas do e-commerce como um todo, mas tem potencial
para alavancar os negócios.
Como a compra de alimentos e bebidas é
recorrente, isto é, se repete de duas a três vezes por mês e com frequência
muito maior do que em eletroeletrônicos e vestuário, ela acaba sendo um caminho
para o varejista online oferecer produtos de maior valor “É aí onde se
ganha dinheiro”, explica o presidente da Sociedade Brasileira de Varejo e
Consumo (SBVC), Eduardo Terra. Além disso, essa é uma via para ampliar a base
de consumidores.
Depois da logística, uma das maiores despesas do
e-commerce é o chamado custo de aquisição de clientes (CAC). Isto é, são os
gastos com anúncios online para fisgar novos consumidores. Com a pandemia, essa
despesa foi reduzida drasticamente, afirma Felipe Dellacqua, sócio da Vtex,
empresa que provê plataforma de e-commerce para um quarto das lojas virtuais do
País.
“Antigamente era como se existisse um lago
com pouco peixe, onde era mais difícil e caro pescar”, compara Dellacqua.
Mas, com as restrições do isolamento devido à pandemia, passou a existir
abundância de consumidores navegando pelo canal digital e ficou muito mais
fácil e barato capturá-los, observa.
Só no primeiro semestre de 2020, 7,3 milhões de
consumidores ingressaram no e-commerce. É quase a mesma quantidade de novos
brasileiros que passaram a fazer compras online no ano inteiro de 2019.
No primeiro semestre de 2020 existiam no Brasil
41 milhões de e-consumidores, número 40% maior do que em igual período do ano
anterior, aponta o relatório Webshoppers, da Ebit/ Nielsen.
Reféns do isolamento social, esses brasileiros
mudaram o hábito de compras e provocaram um salto nas vendas online. Entre
março e setembro de 2020, o volume de vendas do varejo virtual cresceu 45% na
comparação com igual período do ano anterior, apontam dados da Receita. “A
pandemia trouxe a escala que faltava para o e-commerce começar a dar
dinheiro”, afirma Terra.
Essa também é a análise de Dellacqua. A mudança
diz respeito não só ao crescimento do volume das vendas online, mas também à
redução de custos. O ingresso no segmento de supermercados e a adoção de novas
configurações diminuíram gastos importantes. As lojas físicas, por exemplo,
passaram a ser usadas com mais frequência como mini centros de distribuição ou
pontos de retirada de compras.
Pandemia dá impulso a comércio online
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