Dívidas em patamares recordes, atrasos em pagamentos, inflação alta e renda achatada. Estes são apenas alguns dos pontos de pressão sobre famílias e empresas brasileiras em 2021. Enquanto o País passa pelo pior momento da pandemia de covid-19, com picos de mortes, a situação da economia se agrava.
Dados do Banco Central mostram que, em dezembro, o comprometimento da renda das
famílias brasileiras com dívidas bancárias chegou a 31,1%, pico da série
histórica. O dado reflete a parcela dos salários usada para pagar juros e
amortizações de empréstimos. Ou seja: a cada R$ 100 de renda, sobram menos de
R$ 70 para o pagamento das demais despesas. O endividamento das famílias também
é recorde: 56,4% da renda total.
Para a economista Isabela Tavares, especialista em crédito da Tendências
Consultoria Integrada, as ações do governo federal para manter a renda das
famílias em 2020 contribuíram para segurar as dívidas e a inadimplência. Com o
fim de parte dos auxílios, na virada de 2020 para 2021, cresceu a pressão sobre
o orçamento das famílias.
Esse agravamento não é surpresa. “Houve medidas na área de crédito e o
auxílio emergencial, que sustentou a massa de renda. Em 2021, sem as medidas
emergenciais, já se esperava uma reversão”, diz Isabela.
As dívidas bancárias são outro ponto de pressão. Os dados mais recentes do BC
mostram que, por ora, a inadimplência segue em níveis controlados, tanto para
famílias quanto para empresas. Em fevereiro, a inadimplência atingiu 4,1% entre
as famílias e 1,6% nas empresas. Os dados consideram o crédito livre, que
excluem financiamentos com dinheiro do BNDES e da poupança (como o crédito
imobiliário).
Mas a situação não é confortável. Isso porque o BC só considera como
inadimplência os atrasos de mais de 90 dias. No ano passado, os bancos
promoveram renegociações de dívidas e deram carência para o pagamento de
prestações, o que fez o indicador cair no segundo semestre.
Em 2021, os atrasos já começam a crescer. O BC aponta que, em fevereiro, os
atrasos entre 15 e 90 dias – ou “pré-inadimplência – chegam a 3,65%
(famílias) e 1,69% (empresas). Em dezembro, os porcentuais eram de 3,24% e
1,52%, respectivamente.
Dados da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) indicam que, de março a
dezembro de 2020, as renegociações somaram R$ 971,5 bilhões. O valor das
parcelas suspensas somou R$ 146,7 bilhões. Em 2021, essa fatura poderá ter de
ser paga.
Mas, agora, os bancos não têm à disposição um mecanismo que facilitou as
negociações em 2020, quando o governo desobrigou a realização de provisões para
perdas ao renegociar débitos. Em outras palavras, os bancos não tiveram de
guardar recursos para o caso de inadimplência.
Em meio às dificuldades para pagar dívidas, famílias e empresas enfrentam a
escalada da inflação. O IGP-M, o “índice do aluguel” da Fundação
Getulio Vargas (FGV), acumula alta de 31% nos 12 meses até março. O IPCA –
índice oficial de inflação – também está em aceleração. Em março, a alta
acumulada em 12 meses atingiu 6,1%. Preocupado com o avanço dos preços, o BC
elevou a taxa Selic de 2% para 2,75% ao ano. Só que o juro mais alto aumenta o
custo de quem luta para quitar dívidas.
Renda
Enquanto os produtos sobem de preço, a renda segue achatada. O Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostra que a massa de rendimento
do trabalho somou R$ 211,4 bilhões no trimestre encerrado em janeiro de 2021. O
valor é quase 7% inferior ao do mesmo período do ano anterior.
Para o economista Mauro Schneider, da MCM Consultores, a situação econômica em
2021 não é necessariamente pior do que a de 2020. O problema é que o governo
tem espaço menor no Orçamento para medidas de auxílio. “Com as famílias
ocorre a mesma coisa. Quem estava em boa condição tinha reservas no ano
passado”, diz. “Mas parte desses recursos também foi consumida “
Apesar de a dívida bruta brasileira estar próxima de 90% do Produto Interno
Bruto (PIB), Schneider diz não descartar auxílios emergenciais mais “gordos”.
“Tudo depende da vontade política em questões ligadas a gastos públicos.
Olhando os números no detalhe, seria possível gastar mais em auxílios se o
governo realocasse verbas hoje em destinos questionáveis.”