Quando uma vacina segura e eficaz contra a covid-19
estiver disponível à população, é provável que apenas os adultos sejam
imunizados primeiro. As crianças, grupo de menor risco para o novo coronavírus,
entraram há pouco tempo em testes clínicos pontuais – dos quatro autorizados
pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), apenas um engloba
pessoas a partir de 16 anos. Por isso, especialistas ouvidos pelo Estadão afirmam
que poderá levar meses para que crianças e adolescentes sejam vacinados. Há
quem diga que o imunizante para eles possa chegar somente depois de 2021.
No Brasil, entre os testes clínicos autorizados,
o que engloba participantes mais jovens é o produzido pela Pfizer com a
BioNTech, que vai avaliar o produto em adolescentes a partir dos 16 anos e
adultos. Já a vacina da Universidade de Oxford e da AstraZeneca incluiu idosos
e crianças de 5 a 12 anos nos testes de fase 2 apenas no Reino Unido. Aqui, a
farmacêutica informou que “a prioridade atual é reunir evidências sobre o
potencial da vacina para proteger as populações mais vulneráveis a resultados graves”.
“A inscrição de crianças começará assim que
dados suficientes forem reunidos em adultos, indicando que a AZD1222 tem
potencial para ser segurae protetora em crianças”, disse a empresa. O
mesmo caminho vai seguir o Instituto Butantã, que tem feito testes no País de
um imunizante da chinesa Sinovac. O centro de pesquisa brasileiro vai aguardar
os resultados de estudos clínicos em 552 voluntários saudáveis com idade entre
3 e 17 anos na China, que devem começar este mês. Só depois será definido se e
como as crianças serão incluídas aqui.
No caso da vacina produzida pela
Johnson&Johnson, também no Brasil, o estudo clínico de fase 3, cujo início
foi anunciado quarta-feira, vai avaliar a segurança e a eficácia do produto em
cerca de 60 mil adultos com idades acima de 18 anos. Ainda não há informações
sobre a inclusão de crianças nos testes.
Pensar em uma vacina para esse público exige
certo cuidado, porque crianças não são simplesmente adultos em miniatura. Elas
podem ter resposta imunológica diferente dos mais velhos e precisar de doses
diferentes também. Especialistas afirmam que, no caso do imunizante contra a
covid-19, os dados epidemiológicos e os primeiros achados sobre os impactos da
doença nortearam as pesquisas. Desse modo, o foco está nos grupos com mais
risco de complicações, situação que não contempla as crianças.
“Em geral, essas fases de pesquisa focam
nos grupos mais vulneráveis para determinada doença, mas, para chegar ao grupo,
a pesquisa precisa de dados epidemiológicos que vão guiar para faixas etárias.
Para covid, epidemiologicamente, são os idosos e profissionais da saúde, mas,
na primeira fase, que tem abordagem inicial para avaliar a segurança e
eficácia, os voluntários são adultos, jovens e saudáveis”, explica Juarez
Cunha, presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm).
Isso não quer dizer, porém, que os estudos com
crianças não devam ser realizados. “É importante ter braços de pesquisa
que apliquem nas crianças. Esta é uma doença nova. Com o retorno às aulas e a
mobilidade, podemos ver o que não vimos com as crianças fora da escola.”
Para Renato Kfouri, presidente do Departamento
de Imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), a imunização das
crianças pode demorar. “As crianças não serão prioridade porque não adoecem
com mais gravidade do que outros grupos e não transmitem com mais
frequência.”
Em nota, o Ministério da Saúde informou que os
grupos prioritários para vacinação contra a covid-19 estão sendo estudados pelo
Programa Nacional de Imunizações (PNI). A Anvisa informou que ainda não recebeu
pedido de autorização para estudos clínicos em crianças.
Crianças devem ficar no fim da fila da vacina de covid-19
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