Enquanto uma fábrica em Candeias, no
interior da Bahia, reativa três linhas de produção de placas de acrílico,
outra, em Curitiba (PR), minimiza as perdas da pandemia ao vender mais
guardanapos descartáveis embalados em plástico. As duas empresas vivem mudanças
de demanda em razão das novas normas de segurança trazidas pela covid-19.
No caso baiano, a Unigel havia fechado as três
linhas em 2016. Na época, a concorrência com produtos asiáticos foi um dos
fatores que tornou a operação inviável. A empresa já planejava reabrir uma das
linhas no início deste ano, ao considerar a situação econômica do país mais
favorável. A pandemia, porém, levou à reabertura de uma linha em julho e de
outra em agosto. As mil toneladas de chapas de acrílico que a Unigel tem
capacidade para produzir serão usadas em supermercados e outros
estabelecimentos para impedir o contato dos clientes com os funcionários. A
empresa estima que o faturamento anual dessas linhas reabertas seja de R$ 300
milhões. Wendel Souza, diretor-Geral de operações comerciais da Unigel, diz que
a demanda por esse tipo de barreira sanitária já garantiu vendas até outubro
deste ano, com encomendas que se estendem a novembro “Quando tudo isso
acabar, o mercado continuará existindo. Talvez a gente não produza nas três,
mas em pelo menos duas”, diz Souza.
Para Wesley Soares, de 27 anos, que estava
desempregado desde outubro de 2019, voltar a trabalhar durante a pandemia foi
uma surpresa. Ele passou a integrar a equipe em junho deste ano. Formado em
engenharia de produção, atua agora como operador de manufatura, com um salário
inferior ao do último emprego. Mas a recolocação profissional foi a prioridade
no momento. “Desde quando iniciei meu primeiro estágio, não havia passado
mais de 45 dias sem trabalhar”, conta. Na nova empresa, porém, Soares já
foi incentivado a voltar a estudar, para galgar novas posições.
No Sul do País, em Curitiba, a Relevo
Guardanapos, voltada à fabricação de guardanapos de papel, viu seu faturamento
cair 92% com o fechamento do comércio em março. Ao completar 40 dias de fábrica
fechada, a empresa buscou minimizar as perdas, apostando nas novas normas de
segurança dos restaurantes. A fabricante tirou a poeira de uma máquina que
embala guardanapos de luxo em plástico. O equipamento já não era usado desde
quando Rio e São Paulo restringiram o uso de descartáveis nos restaurantes. Com
a crise sanitária, porém, os estabelecimentos que reabrem já não querem usar
guardanapos de pano, como faziam antes. Nesse cenário, levar à mesa um produto
embalado individualmente se tornou ideal. Além disso, novos itens, mais
sofisticados, foram incorporados ao portfólio da fabricante. “Esses
momentos de crise fazem a gente repensar e se reinventar”, diz Celso
Rufatto, diretor administrativo da empresa. “Foi muito difícil, reduzimos
cerca de 60% do nosso quadro de funcionários. Mas agora já estamos
recontratando alguns”.
A iniciativa da Relevo em criar produtos
premium, que substituam os guardanapos de pano, fez com que a empresa atingisse
em junho 34% do que havia faturado no mesmo período de 2019. A estimativa para
julho é chegar a 42% das vendas do mesmo intervalo do ano passado. “O
plástico era vilão, não sem motivo. Creio que quando vier uma vacina, a gente
deixe de usá-lo desta maneira na produção”, diz Rufatto, apostando que o
faturamento volte ao normal em março do ano que vem. A empresa estima que,
mesmo sem a embalagem de plástico, as vendas aumentem em 30% em relação a 2019,
a partir dos novos modelos que desenvolveu.
Assim como Rufatto, há quem diga que o plástico
passou de vilão a herói na pandemia, e a percepção da sociedade sobre o consumo
de descartáveis deve mudar no pós-covid. Para o presidente da Associação Brasileira
da Indústria do Plástico (Abiplast), José Ricardo Roriz Coelho, porém, o
aquecimento deste segmento específico está longe de aliviar os efeitos da crise
para a indústria como um todo. “O segmento de descartáveis, que representa
cerca de 2,5% dos mercados consumidores de plásticos, segue aquecido, a exemplo
de embalagens para itens de saúde, higiene e limpeza. Porém, os transformadores
que fornecem para o setor automotivo ou para a construção civil continuam em
situação delicada”, diz Coelho. “A queda de 35% na produção em maio
indica continuidade do movimento de retração na indústria do plástico”,
afirma.
Segundo sondagem da Abiplast, houve uma redução
média de 13% nos empregos do setor em maio, queda significativa considerado
que, em abril, a retração já havia sido de 35%. Atualmente, 58% das empresas do
setor lançam mão da redução de jornada e salários para 36% da sua força de
trabalho, bem como antecipações de férias, na tentativa de manter os empregos.
Fontes da indústria afirmam que o setor vê oportunidades
trazidas pela pandemia que vão além das placas de acrílico e descartáveis em
geral. Equipamentos hospitalares estão no topo da lista de produtos para os
quais o Brasil deveria se reindustrializar.
Fora da pandemia, essa indústria vê no Novo Marco
Regulatório do Saneamento uma chance de o plástico descartável se redimir mais
uma vez: o tratamento de resíduos pode ser uma oportunidade de negócios para as
empresas privadas, a partir da preparação dos itens para serem reutilizados
como matéria-prima de novos produtos.
Descartáveis geram empregos na pandemia, mas indústria do plástico ainda sofre
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