Em um dia considerado histórico para os educadores
e com uma derrota do governo, a Câmara aprovou nesta terça-feira, 21, a
prorrogação do Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), principal
mecanismo de financiamento das escolas públicas do País. Além de aumentar a
quantidade de recursos que a União passa a depositar no fundo, o novo formato
diminui a desigualdade, destinando mais dinheiro aos municípios mais pobres.
Com as mudanças, 17 milhões de alunos a mais serão beneficiados no País, por meio
de recursos para a escolas em que estudam.
Foram 499 votos a favor e 7 contra. O Fundeb foi
criado em 2007 e expirava no fim deste ano, mas o governo Bolsonaro se recusou
a discutir a prorrogação até a véspera da votação, o que chegou a colocar o
mecanismo em risco. No sábado, o governo quis destinar recursos do fundo
renovado ao Renda Brasil, que ainda está sendo desenhado pela equipe econômica
para substituir o Bolsa Família, para driblar o teto dos gastos federais (que
não atinge o Fundeb), e ainda limitar o gasto com salário de professores.
O fundo funciona como uma conta bancária que
recebe 20% do que é arrecadado em impostos, na maioria estaduais, como ICMS e
IPVA. Até agora esse dinheiro era dividido pelo número de alunos em cada
Estado. O resultado dessa conta não podia ser inferior ao valor mínimo por
estudante estipulado pelo governo federal, cerca de R$ 3 mil. Os Estados mais
pobres ganhavam ajuda financeira da União, que até hoje representava 10% do
Fundeb. Com a aprovação desta terça-feira, o governo federal passa a responder
por 23% do total dos recursos, que vai aumentar gradativamente durante seis
anos.
Outra mudança é que a lógica, que era estadual,
passa a ser municipal. Ou seja, municípios pobres em Estados ricos não recebiam
essa complementação da União. Segundo cálculos do Todos pela Educação, 2745
redes de ensino e 17 milhões de alunos a mais receberão dinheiro para aumentar
o quanto investem por estudante.
“Com essa arquitetura redistributiva, se
alcança mais municípios Caso contrário, a União teria que colocar muito mais
dinheiro”, diz a presidente do Todos pela Educação, Priscila Cruz. “É
um momento histórico. Vai se dar mais para quem mais precisa e menos para quem
menos precisa.” Ela considera o aumento da complementação para 23% algo
espetacular. Parte desse dinheiro, 5%, terão que ser destinados apenas para a
educação infantil, principalmente para aumento de vagas nas creches.
Originalmente, a proposta da relatora Dorinha
Seabra (DEM-TO) previa ampliar a complementação da União partindo de 15% em
2021, chegando progressivamente a 20% até 2026. Em 2019, o Fundeb movimentou R$
156 bilhões, sendo R$ 14 bilhões da União. Cada ponto porcentual a mais
representa cerca de R$ 1,5 bilhão.
Durante a leitura do relatório, Dorinha elogiou
o empenho do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) em aprovar o Funded.
Maia chorou emocionado. “Sabemos que são despesas que são investimentos
nas nossas crianças e futuro de tantos brasileiros”, disse Maia. Ele
agradeceu, além da Câmara, Ramos e Vitor Hugo ao final da votação A aprovação
desta terça-feira foi do texto-base em primeiro turno. Deputados precisam ainda
votar os destaques (pedidos de alteração) e depois o segundo turno.
Posteriormente, a proposta segue para o Senado.
Nos últimos dias, a proposta foi discutida entre
o ministro Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria de Governo, o presidente da
Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e Dorinha. A equipe econômica defendia uma
complementação de 22%, com 4% para os benefícios à primeira infância.
Outra proposta do governo rechaçada pela Câmara
era que a PEC só tivesse validade a partir de 2022, deixando um vácuo durante
2021. Era questão de discordância também a proibição do uso de verbas para o
pagamento de aposentados e pensionistas. O governo queria permitir isso.
Todos esses pontos levaram aos partidos do
Centrão a protocolarem seis requerimentos de obstrução na manhã desta
terça-feira, com objetivo de atrasar a votação, mas os pedidos foram retirados
antes do início da sessão.
“Vamos assegurar pela primeira vez que a
educação infantil tenha prioridade”, disse Dorinha. “Hoje queremos
escola boa com profissionais respeitados”, afirmou a relatora. Ela
parabenizou a atuação de Maia durante a tramitação da proposta, que chorou no
plenário da Câmara ao ouvir a homenagem da colega.
A relatora estabeleceu também no texto aprovado
a revisão do Fundeb a cada dez anos, que era uma das demandas do governo.
Dorinha manteve também piso de 70% como o mínimo a ser aplicado no salário de
professores, e não o máximo, como a equipe econômica queria. Esse ponto, no
entanto, pode ainda ser modificado nos destaques. A relatora também determinou
que o padrão mínimo de qualidade do ensino garantido pela União, por meio de
assistência a estados e municípios, deve ter como referência o custo aluno qualidade
(CAQ), um parâmetro de financiamento educacional previsto no Plano Nacional de
Educação (PNE).
“Nos últimos dias alguns grupos surgiram
para dizer que esse não era o momento para aprovar o Fundeb, pois estamos
passando por uma grave crise econômica e fiscal. Se enganam aqueles que pensam
que educação não pode contribuir com a superação da crise que estamos vivendo,
serão nossas escolas públicas que acolherão os estudantes”, afirmou a
deputada Tabata Amaral (PDT-SP), que se disse emocionada e esperançosa
“nesse dia histórico”.
“Nós estamos deixando claro na
Constituição, na carta magna, que não vamos sossegar enquanto tiver um
brasileiro ainda sem acesso à educação”, disse a deputada Soraya Santos
(PL-RJ). Parlamentares do PSOL destacaram a atuação de professores nas redes
sociais durante o dia para garantir a aprovação da proposta. “Estamos
falando de um programa para incluir 3 milhões de jovens fora da escola e
valorizar professores”, disse a deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP).
Fundeb é aprovado e 17 milhões de alunos a mais podem ser beneficiados
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