A pandemia do novo coronavírus impõe alterações em
todos os meios de transporte, em especial naqueles que levam muitas pessoas,
que acabam ficando mais expostas a contaminações Para evitar que a fuga atual
de passageiros se mantenha, companhias aéreas e empresas de transporte
municipal e rodoviário trabalham no desenvolvimento de tecnologias que
minimizem o contágio nesses ambientes e oferecem maior segurança aos usuários.
Algumas fabricantes já começaram a oferecer
ônibus com itens como poltronas feitas com tecidos antivirais e proteção nas
barras de apoio do passageiro. No caso dos aviões, onde o sumiço de passageiros
foi mais notado, há estudos para uso de luz ultravioleta nos banheiros e de
superfícies que eliminam micro-organismos.
Ainda que haja empecilhos, a indústria do
transporte tem procurado soluções até mesmo para os automóveis que, apesar de
não serem objetos de aglomeração, são compartilhados por diferentes pessoas
dado o grande volume de usuários de aplicativos como Uber, 99 Táxi e de
serviços de locação.
Mesmo com a chegada de uma vacina, as companhias
acreditam que o “novo consumidor” continuará em busca de segurança,
seja contra a covid-19, a gripe ou qualquer outro vírus que eventualmente
surja.
“Independente do coronavírus, estamos
agregando valor ao nosso produto, trazendo algo benéfico para as pessoas que
pode ser entendido como qualidade de serviço. Não é uma aposta de curto
prazo”, diz Rodrigo Pikussa, diretor do Negócio Ônibus da Marcopolo.
Algumas das tecnologias, porém, podem demorar
para serem adotadas em larga escala. Isso porque encarecem o produto num
momento em que as empresas estão com problemas de caixa para promover altos
investimentos e também porque o consumidor pode não estar disposto a pagar o
repasse desses custos.
O sócio da consultoria KPMG no Brasil, Ricardo
Bacellar, acredita que os custos dessas inovações podem inibir novos projetos,
principalmente aqueles que exigem mudanças na forma de produção. “Isso
leva um tempo, pois, no caso das montadoras, são necessários muitos testes e
homologações”. Em sua opinião, também não há garantias ainda de que essas
tecnologias sejam de fato seguras contra contaminações – embora as empresas
afirmem que todas elas foram testadas em laboratórios independentes e
certificadas nos organismos responsáveis.
Fabricantes de aviões trabalham na criação de
banheiro estéril
Com um sistema já bastante eficiente para
filtrar o ar nas cabines, a indústria da aviação busca agora medidas que
garantam que vírus e bactérias não resistam por muito tempo em assentos ou nos
banheiros. As fabricantes de aeronaves têm trabalhado, em parceria com
fornecedores, para desenvolver, por exemplo, um banheiro estéril e uma varinha
de luz ultravioleta que possa ser mais uma ferramenta para desinfetar aviões.
A americana Boeing tem atuado na pesquisa de
três tecnologias. A primeira seria um revestimento de assentos que os blindaria
contra micróbios. Apesar de já existirem tecidos que fazem isso, eles demoram
algumas horas para matar certos micro-organismos. A ideia é desenvolver algo
que atue de modo mais rápido, diz o diretor de marketing de produtos da
companhia, Jim Haas. Em coletiva de imprensa, Haas afirmou que algumas
companhias aéreas já mostraram interesse pelo produto, mas não citou quais.
A Boeing estuda também adotar varinhas de luz
ultravioleta na desinfecção das cabines e desenvolveu um protótipo de um
banheiro com essa radiação, no qual 99,9% dos germes seriam exterminados em
três segundos após cada uso. Haas, porém, afirma que deve demorar um pouco para
vermos esses banheiros em operação. Apesar de não especificar quanto tempo, ele
explica que os banheiros ainda dependem da certificação dos órgãos regulatórios
do setor aéreo.
Para Haas, algumas das mudanças nas viagens
aéreas devem permanecer mesmo depois de passada a pandemia, como a medição de
temperatura dos passageiros antes do embarque. “Algumas das alterações na
jornada da viagem serão permanentes. Vamos ver quais tecnologias e procedimento
são eficientes e quais não trazem tanto benefício”, destacou.
A Embraer também trabalha no desenvolvimento de
um banheiro estéril, no qual, além da luz ultravioleta, deve haver portas que
abrem e fecham automaticamente e acionamento de descarga e torneira por
sensores. A adoção de um banheiro como esse também dependerá do interesse das
companhias aéreas pela tecnologia.
A exemplo da Boeing, a fabricante brasileira
analisa os materiais antivirais para o revestimento de assentos e também para
cobrir a tela de entretenimento a bordo. Nesse caso, seria adotada uma película
transparente com capacidade de eliminar micro-organismos.
Na Airbus, pesquisas semelhantes estão em
andamento. Segundo o presidente da companhia na América Latina e no Caribe,
Arturo Barreira, no entanto, a adoção de torneiras automáticas nos banheiros,
por exemplo, pode levar tempo. “Mudar tudo não é algo que se possa fazer
imediatamente. As empresas aéreas ainda precisam ver quais mudanças realmente
fazem diferença.”
Barreira destaca que, apesar de uma possível
demora na adoção das novas tecnologias, a maioria dos aviões conta, desde 1994,
com filtros Hepa (filtros de detenção de partículas de alta eficiência). Esse
filtros, que também são adotados por hospitais e conseguem eliminar 99,9% dos
germes, tornam as aeronaves ambientes onde a propagação do vírus é mais
difícil.
Os aviões ainda têm um mecanismo que garante que
entre ar novo na cabine a cada três minutos, no máximo. O ar flui de cima para
baixo, e não da frente para o fundo, diminuindo o risco de contágio, diz
Barreira.
Empresa de ônibus já vende modelo ‘bioseguro’
A Marcopolo já está vendendo no Brasil e
exportando para Argentina, Chile e Angola o ônibus rodoviário chamado de
Biosafe, com barras e pontos de apoio feitos com material plástico que recebe
um aditivo para inativar os vírus em caso de contato, poltronas com tecidos
feitos com o mesmo aditivo, assim como cortinas que separam os passageiros.
Os sanitários dos veículos têm luz ultravioleta
para desinfecção acionada automaticamente quando a pessoa sai do local. A mesma
radiação foi levada para dentro do sistema de ar-condicionado e inativa
micro-organismos que estejam na corrente de ar.
Além disso, a empresa oferece aos clientes a
opção de bancos individuais em três fileiras. “É uma alternativa de
serviço diferenciado que, além do distanciamento, oferece mais privacidade ao
passageiro”, afirma Rodrigo Pikussa, diretor do Negócio Ônibus da
Marcopolo.
Os produtos foram desenvolvidos por um grupo
formado por infectologistas, assessores técnicos, universidades, especialistas
e startups e, segundo Pikussa, testados pelo laboratório da Universidade de
Caxias do Sul (RS). Outro serviço oferecido é o de desinfecção do veículo, por
meio de uma névoa seca formada com um desinfetante hospitalar certificado pela
Anvisa.
O efeito da aplicação dura três dias. “Já
estamos fazendo desinfecção de quarto de hotel, clínicas, salas de aula e
outros ambientes e até criamos uma divisão chamada de Fip Space para cuidar
desse negócio que surgiu por acaso”, conta Pikussa.
Outro negócio que nasceu dessa experiência foi a
produção de totens para serem colocados na entrada dos ônibus, nas rodoviárias,
para a realização de check-in sem contato entre passageiro e motorista. O
equipamento mede a temperatura da pessoa, tem câmera que identifica se ela está
usando máscara, sistema para ler o QR Code da passagem e um dispenser
automático de álcool em gel.
O executivo informa que o preço da adaptação de
um ônibus usado custa 20% do valor desse veículo. Já um modelo novo, que sai de
fábrica com todos os sistemas, é mais vantajoso e custa 2% mais do que um
normal. “Acredito que as pessoas vão estar mais seguras num ônibus nosso
do que em alguns ambientes como shoppings e supermercados”, diz Pikussa.
Nas cidades, tecnologia ainda depende de
testes
Com maior foco em ônibus urbanos, segmento que
lidera no mercado brasileiro, a Caio desenvolveu materiais para encapsular
todos as barras usadas como apoio pelos passageiros, seja na entrada do
veículo, no teto ou no encosto dos assentos. Revestimentos também são
instalados nas laterais e os bancos levam tecidos antibacterianos.
O desenvolvimento foi feito em parceria com a
Chroma Líquido, empresa homologada pela Rhodia para a produção de tecidos com
um inédito fio antiviral lançado recentemente. Esses tecidos serão usados nos
bancos.
A poliamida do fio também será aproveitada na
produção de plásticos para os tubos e laterais dos ônibus. Carpetes antivirais
serão colocados no primeiro degrau para higienizar os calçados dos usuários. A
eficácia do fio foi testada por laboratórios independentes, mas a Caio aguarda
exames do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) para iniciar as vendas
Os testes foram solicitados pela Secretaria de
Transportes Metropolitanos de São Paulo, que estuda adotar essas alternativas
no transporte público. Além de ônibus, a Chroma também está fazendo testes
internos para uso do tecido antiviral no metrô.
O ônibus que a Caio está usando para
demonstração já era de linha e recebeu capas nos bancos e revestimento nas
barras, processo que pode ser estendido a toda uma frota. Se os materiais forem
introduzidos na produção dos veículo, o custo será menor, diz Maurício Cunha,
diretor industrial da companhia. “Recebemos várias consultas de empresas,
mas vamos esperar o laudo do IPT para oferecer o produto oficialmente.”
A Caio também testa um equipamento que trata a
qualidade do ar dos exaustores. “Trabalhamos numa solução que mantenha a
velocidade de troca a cada dois minutos, mas que deixe o ar ainda melhor para
evitar a circulação de vírus e bactérias.”/ C S.
Carros podem ter separador de cabine
A indústria de automóveis ainda avalia o que
deve ser adotado para tornar os carros mais seguros em termos sanitários. Usar
tecidos antivirais e antibacterianos na produção dos bancos é a medida que está
em estudo por pelo menos cinco montadoras, segundo a Chroma Líquido.
A empresa é responsável pelo desenvolvimento e
produção de tecidos e é homologada pela Rhodia, que criou um fio de poliamida
que neutraliza a ação de qualquer tipo de vírus e bactérias. Antes de o produto
ser incorporado aos carros, porém, a empresa iniciará a venda de capas para
bancos de automóveis no mercado de reposição.
Outro item que já está no mercado, direcionado
principalmente a carros usados por motoristas de aplicativos e taxistas é um
separador de cabine criado pela Toyota e adaptado a cada modelo de veículo da
marca. O acessório parece uma cortina e veda a parte frontal da traseira do
veículo, mantendo apenas uma abertura na parte inferior para realização de
pagamentos. Custa entre R$ 340 e R$ 365.
A principal iniciativa até agora das fabricantes
foi iniciar a prestação de serviços de higienização dos carros.
A Ford foi mais longe e criou um serviço de
desinfecção similar ao realizado em UTIs de hospitais, que utiliza desinfetante
com ação comprovada contra vírus, bactérias e fungos. O serviço custa R$ 129.
A Hyundai também oferece serviço superior ao da
higienização, que inclui sanitização por ozônio para livrar a cabine do carro
de fungos e bactérias, esterilização dos pontos de contato e limpeza do
ar-condicionado e troca do filtro. Custa R$ 99.
Transporte muda para enfrentar covid
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